25/02/2016

NÃO É MODA, É CAUSA







Não, não se trata de mais uma polêmica do mundo da moda, como o uso de Crocs - que para uns representa a libertação espiritual, o ápice da transcendência, enquanto para outros é a clara desistência da vida, o último ato de desprezo à sociedade (o próximo passo do usuário de Crocs, dizem as más línguas, seria o suicídio de pantufas, atirando-se num rio corrente para que as águas se encarreguem de lavar sua alma sem fé, sem amor-próprio, sem salvação).

Não digo a que grupo de opiniões sobre Crocs pertenço, porque provavelmente buscaria um caminho do meio, menos polarizado, que encontrasse, talvez nas havaianas (que vai da praia ao tapete vermelho de Cannes), uma forma mais confortável de pertencer aos dois mundos, já que considero o maniqueísmo sempre perigoso e redutor.

Quero falar das meninas do Colégio Anchieta de Porto Alegre, que estão atraindo os olhares para suas pernas – não no sentido erotizado que a mulher está acostumada a vivenciar, mas no sentido que importa: o da causa.

Elas protestam contra regras estranhas e paradoxais. Alegam que a Escola não impõe uniforme aos estudantes do Ensino Médio mas que proíbe, contudo, o uso de shortinho às minas (bermudas e shorts para os guris estaria ok).

Elas poderiam apenas pedir a flexibilização da regra à Direção – e o calor de 36° desse verão seria um forte aliado do convencimento. Mas não. Elas quiseram radicalizar na melhor acepção da palavra: ir à raiz, buscar a origem da questão.

Então, vestidas com cartazes, shortinhos, e um discurso inteligente, as meninas denunciaram que tal proibição reforça a cultura machista de objetizar partes do corpo feminino como se fossem itens de consumo para selvagens famintos. Que transfere à mulher a culpa pelo assédio, abuso e desrespeito. Que atribui à vestimenta (assim ou assada) uma condição moral que deveria estar na humanidade de cada um, e não no seu guarda-roupa.

Não deixo de compreender, por outro lado, o desconforto dos mais ortodoxos. Sociedade é convívio de diferentes ideologias. E cultura não é um castelo de areia que se constrói numa rápida relaxada à beira mar. Assim como nossas avós suaram para queimar sutiãs, há trabalho pela frente.

Foi recém ontem, nos Anos 60, que o biquíni de duas peças deixou de ser aquele escândalo proposto em Paris vinte anos antes.

A causa não é moda, e é longa. Essas meninas não estão simplesmente contestando regras. Estão fortalecendo a emancipação da mulher. Combatendo e desintegrando signos repressores.

E mais - escolheram o lugar certo para radicalizar: a escola, um ambiente que se propõe seguro, justo, educativo e democrático. Que oferece a caixa de areia para os que preferem brincar sossegado no quadradinho. E o pátio para quem quer reconstruir conceitos.

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